A trajetória de Heitor Szabo na ciência começou com desenhos animados e vídeos no YouTube que despertaram sua curiosidade sobre o universo. Mas foi com a participação na Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica (OBA) que seus horizontes realmente se ampliaram. “Antes da OBA, eu nem sabia que existiam olimpíadas científicas ou que era possível estudar no exterior com bolsa. Hoje, minhas escolhas acadêmicas e projetos pessoais são profundamente influenciados pelas oportunidades que ela me apresentou”, relata.
Depois de conquistar medalhas e representar o Brasil em olimpíadas internacionais como a IOAA e a OLAA, Heitor assumiu um novo papel: passou a integrar a Comissão dos Olímpicos, grupo que auxilia na preparação dos estudantes que competirão pelo país. Para ele, reviver esse ambiente sob uma nova perspectiva tem sido gratificante. “Agora, o foco não é mais a minha própria seleção, mas ajudar os outros. Compartilho experiências, erros e aprendizados para que os novos alunos estejam ainda mais preparados”, afirma.

Inspirado por canais como Manual do Mundo, Veritasium e 3Blue1Brown, Heitor criou o Saperientia, projeto de divulgação científica com vídeos que tornam temas complexos mais acessíveis. “Quero mostrar que aprender ciência não precisa ser chato nem linear. O processo de descoberta é desorganizado, cheio de curiosidade, e é justamente essa ‘bagunça’ que potencializa o aprendizado”, explica. A série Essentia Astronomia, por exemplo, explora conceitos como astronomia de posição a partir de perguntas reais que surgem ao olhar para o céu.
Com uma linguagem leve, uso de recursos visuais e foco em conectar a teoria com o cotidiano, o canal ainda está em fase inicial, mas já tem impactado seguidores. “Recebi mensagens de pessoas que, pela primeira vez, entenderam algo que sempre pareceram difícil. Esse é o maior objetivo: alcançar quem nunca gostou de ciência e mostrar que ela pode, sim, ser fascinante”, conclui Heitor, que sonha em atingir um público cada vez maior e inspirar novos apaixonados por conhecimento.
🎙️ Entrevista CCJr | Heitor Szabo, medalhista da OBA e criador do canal Saperientia
CCJr: Que impacto você acha que a OBA teve na sua trajetória acadêmica e nas suas escolhas atuais?
Heitor Szabo: A OBA teve um impacto extremamente positivo na minha trajetória acadêmica e nas minhas escolhas atuais. Além do crescimento pessoal e das amizades que conquistei, a OBA me abriu um leque de possibilidades e oportunidades acadêmicas que eu desconhecia. Antes dela, eu não tinha conhecimento sobre a existência das olimpíadas científicas, muito menos das internacionais, nem sabia da chance de estudar no exterior com bolsa. Hoje, participo de diversas atividades e pretendo me envolver em muitas outras no futuro, tudo graças ao que a OBA me apresentou. Os limites dos meus objetivos e sonhos se ampliaram consideravelmente.

CCJr: Recentemente, você passou de estudante para membro da Comissão dos Olímpicos, que auxilia os novos representantes do Brasil nas olimpíadas internacionais. Como foi retornar a esse ambiente em um novo papel?
Heitor Szabo: É natural que todo estudante olímpico sinta um certo pesar ao pensar no fim de sua “carreira” olímpica. Felizmente, aqueles que participam de competições internacionais de astronomia têm a oportunidade de voltar para integrar a Comissão de Ex-olímpicos, auxiliando na preparação dos futuros competidores. Para mim, é como reviver as experiências passadas, mas agora sob uma nova perspectiva que considero ainda melhor, pois o foco se torna ajudar os outros, e não mais a própria seleção.
CCJr: O que você costuma compartilhar com os estudantes que estão começando essa jornada olímpica? Há dicas ou aprendizados que sempre repassa?
Heitor Szabo: A dica mais crucial, na minha perspectiva atual, é não permitir que o mundo olímpico se torne um mero meio para atingir um fim. É essencial que não se transforme em um estudo mecânico. Na verdade, gostar do que se está fazendo ajudará na preparação, pois o foco estará no aprendizado em si, e não no que ele pode proporcionar. Assim, o entendimento será aprofundado, e essa compreensão genuína será o diferencial.

CCJr: Como surgiu a ideia de criar o canal Saperientia? E por que escolheu esse nome tão curioso?
Heitor Szabo: A ideia do canal Saperientia surgiu antes mesmo de eu conhecer as olimpíadas científicas. Eu sempre gostei de assistir vídeos aleatórios no YouTube, especialmente aqueles que ensinam algo, como Manual do Mundo, Veritasium e 3Blue1Brown. Ao começar a estudar astronomia, percebi que poderia compartilhar conteúdos que não encontrava nos canais que já acompanhava.
Com alguma experiência na criação de vídeos, comecei a planejar o canal. Eu queria um nome que fosse diferente do convencional, que se destacasse, tivesse uma sonoridade agradável e algum significado. Lembrei-me de uma aula de filosofia na escola, onde aprendi sobre o Esclarecimento de Kant e a famosa frase “Sapere Aude”. Para manter a temática em latim, adicionei o sufixo “entia”, que simbolizaria o “estado de saber”.
A ideia ficou em “hibernação” por um tempo, até que, após concluir o ensino médio, pude dar continuidade ao projeto.
CCJr: O que mais te inspira a produzir conteúdo científico? Houve algum vídeo ou canal que te despertou para a ciência?
Heitor Szabo: Meu interesse pela ciência floresceu principalmente ao longo de horas assistindo a desenhos animados, programas de TV e vídeos no YouTube que sempre destacaram o lado fascinante da ciência, nunca o tedioso. Entre as principais influências nesse percurso, destaco: Quintal da Cultura, Manual do Mundo e Veritasium.
CCJr: Seu canal tem um estilo bem didático e acessível. Como você pensa nas formas de explicar assuntos complexos, como trigonometria ou astronomia de posição?
Heitor Szabo: Minha abordagem para explicar temas complexos baseia-se em uma premissa fundamental: ensinar da forma como eu mesmo comecei a entender e a encontrar sentido no assunto. Acredito que o processo de aprendizado deve ser o menos entediante e o mais relevante possível, fugindo das abordagens tradicionais que muitas vezes começam pelo fundamental e progridem linearmente para o intrincado.
Ao contrário do que se observa em muitos livros didáticos, o processo de descoberta, tanto na história da ciência quanto na jornada individual de um estudante, é inerentemente desordenado. Existe uma “bagunça” importante no aprendizado que, na verdade, potencializa a assimilação do conhecimento. Essa desordem não é um empecilho, mas sim uma característica que deve ser abraçada.
Como o grande físico e professor Richard Feynman sabiamente observou: “Estude muito o que mais lhe interessa da maneira mais indisciplinada, irreverente e original possível.” Essa citação demonstra perfeitamente a filosofia que aplico na criação do conteúdo do meu canal. Em vez de seguir um roteiro rígido, procuro identificar os pontos de interesse e as analogias que tornam o tema complexo algo palpável e animador.
Por exemplo, na astronomia de posição, em vez de mergulhar de imediato nas coordenadas celestes, posso começar com a observação do céu noturno e as perguntas que naturalmente surgem: “Por que as estrelas parecem girar?” ou “Como sabemos onde os planetas estarão?”. A partir dessas perguntas, desvendamos gradualmente os conceitos de esfera celeste, equador e eclíptica, tornando a teoria uma resposta lógica a uma curiosidade já estabelecida.

Essa é a base da série Essentia Astronomia, que o Saperientia lançará para ajudar nos estudos para as seletivas de astronomia.
CCJr: Você acha que a forma como a ciência é ensinada nas escolas poderia se beneficiar mais de recursos visuais e interativos?
Heitor Szabo: Existem muitos problemas no ensino de ciência que vão além dos recursos didáticos. Não acredito que esses recursos sejam a solução definitiva. No entanto, é inegável que ferramentas visuais e interativas destacam dois pontos cruciais para um ensino eficaz: tornar o aprendizado divertido e conectar a teoria à realidade do aluno. Afinal, a escola não se resume apenas ao conhecimento teórico.
CCJr: Que tipo de retorno você recebe dos seguidores do canal? Alguma mensagem já te emocionou ou te marcou de forma especial?
Heitor Szabo: O canal está apenas começando, então há muito espaço para crescimento. No entanto, já recebi feedbacks positivos de pessoas que, antes, nunca tinham compreendido um conceito e, após uma explicação no estilo Saperientia, tudo fez sentido de uma forma fácil. Fico especialmente satisfeito com os comentários no vídeo “Como zerar o Minecraft com Matemática”. Apesar de vários deles apresentarem conotações negativas, os comentários consistentemente revelam um conflito que não deveria existir entre ciência e diversão. É justamente essa ferida que o Saperientia busca cutucar.
CCJr: Que conselhos você daria para estudantes que querem participar da OBA ou criar seus próprios projetos de divulgação científica?
Heitor Szabo: Comece, participe e faça acontecer. Não se preocupe com os resultados.
CCJr: Para finalizar, qual é o seu maior sonho como divulgador científico?
Heitor Szabo: Alcançar um público mais amplo e aprimorar continuamente as técnicas para despertar o interesse pela ciência em estudantes que antes não gostavam, e para que aqueles que não a compreendiam passem a entender e apreciar, assim como eu apreciava.